12 de setembro de 2010
Oliver Stuenkel
O próximo presidente do Brasil será o líder de uma nação que nunca foi tão poderosa quanto hoje. Analistas internacionais estão, neste momento, avaliando os candidatos e tentando prever quais políticas o eleito adotará. Os brasileiros, por sua vez, devem prestar mais atenção em países que terão papel determinante nas próximas décadas. Um dos atores globais que os analistas brasileiros têm menosprezado é a Índia, maior democracia do mundo e, em breve, país mais populoso do planeta. A Índia está em via de se tornar uma potência global, e os brasileiros ainda compreendem pouco a política interna daquele país.
Uma personalidade com quem o próximo presidente do Brasil certamente terá de lidar é Rahul Gandhi, muito provavelmente o próximo primeiro-ministro da Índia. Quando esse político indiano celebrou seu 40º aniversário, dois meses atrás, fontes internas do governo em Nova Delhi não discutiram se, mas quando o herdeiro político do clã Nehru-Gandhi viria a ser o líder da maior democracia do planeta. Seu bisavô (Jawaharlal Nehru), sua avó (Indira Gandhi) e seu pai (Rajiv Gandhi) foram todos primeiros-ministros. E Rahul parece preparado para herdar o “trono” tão logo Manmohan Singh, o atual primeiro-ministro, esteja pronto a assumir a presidência, um posto de caráter meramente protocolar. Entretanto, quem é “o homem que será rei”, como o jornal Times of India a ele se referiu recentemente, e o que significaria sua liderança para a Índia e para o mundo?
A inevitabilidade de sua eventual ascensão ao poder permitiu a Rahul explorar sem pressa outras searas. “Eu poderia ter entrado na política quando meu pai morreu”, diz ele, que perdeu a avó e o pai assassinados em 1984 e em 1991, respectivamente. “Mas eu era novo e nada tinha a oferecer.” Após obter grau de mestre em estudos sobre desenvolvimento, em Cambridge (Inglaterra), ele trabalhou como consultor em administração em Londres. Em 2004, aos 34 anos de idade, finalmente se voltou para a política e conquistou uma vaga no parlamento. Viajou muito, inclusive ao Brasil, onde veio conhecer a estratégia do governo para o enfrentamento do HIV/Aids. Há quem diga também que é ardoroso torcedor da Seleção Brasileira.
Após alguns anos como parlamentar, Rahul Gandhi deu início a uma autopromoção mais agressiva, organizando uma bem-sucedida eleição de seu partido na campanha de 2009. Ele tem viajado mais pela Índia do que qualquer outro político, dando particular atenção ao aam aadmi, o homem comum, o qual tem cada vez mais apoiado os partidos regionais baseados em castas, enfraquecendo a posição do Partido do Congresso junto aos mais desfavorecidos. No entanto, a despeito de sua crescente presença nos outdoors pela Índia afora e de suas amplamente documentadas visitas de helicóptero a vilarejos pobres, virtualmente nada se sabe sobre as posições políticas de Rahul Gandhi. Ele recusou um ministério no governo Singh e raramente comenta questões políticas delicadas. Recusa-se categoricamente a dar entrevistas e nunca enfrentou o teste de um debate ao vivo. Toda essa reserva e essa discrição dificultam ataques de seus adversários e mantêm certa mística em torno de sua personalidade.
O crescimento sem esforço de Rahul, apesar de sua falta de experiência política, indica o poder que o nome Gandhi ainda possui na Índia. Entretanto, isso também evidencia a carência de alternativas de jovens líderes com desenvoltura, além do perigo de que uma potência mundial com armas nucleares possa, em breve, vir a ter como líder um colunável inexperiente, que costuma passar seus fins de semana em resorts de luxo na praia e em corridas de Fórmula 1. Afinal de contas, o melhor primeiro-ministro que a Índia teve nas últimas décadas, Manmohan Singh, não era um Gandhi carismático, mas um tecnocrata pacato e modesto, o qual estoicamente impôs reformas que permitiram à Índia crescer economicamente. Isso mostra que escolher um líder baseado no mérito costuma ser mais seguro do que confiar em uma dinastia. Ainda não dá para saber se Rahul Gandhi é o administrador e o estrategista amadurecido necessário para guiar a Índia pelos gigantescos desafios dos próximos anos.
No entanto, quem quer que vença a eleição presidencial no Brasil em outubro deve ter em mente convidar o futuro líder indiano para vir a Brasília e demonstrar o interesse do Brasil em laços mais fortes com a Índia. E Rahul certamente não recusaria um convite para assistir a uma partida da Seleção Brasileira.
Oliver Stuenkel
Professor visitante de relações internacionais na Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador do Global Public Policy Institute (GPPi), em Berlim