Sábado, 21 de maio de 2011
Por Thorsten Benner e Oliver Stuenkel
Em abril de 2009, na cúpula do G20 em Londres, europeus e norte-americanos demonstraram a intenção de parar de dividir entre si os postos de liderança do Banco Mundial e do FMI. “Concordamos que os chefes e líderes máximos das instituições financeiras internacionais deveriam ser indicados por meio de um processo seletivo aberto, transparente e baseado no mérito”, dizia a Declaração dos Líderes da cúpula. A Europa prometeu abrir mão de seu privilégio de escolher o chefe do FMI.
Mas agora, com as acusações de assédio sexual contra o atual Diretor Geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, e da necessidade de substituí-lo, a Europa está defendendo sua prerrogativa ao cargo máximo do Fundo e rejeitando a justa reivindicação de nações emergentes, como China, Brasil e África do Sul, para que se coloque um fim a esse tradicional monopólio. No entanto, em vez de apegar-se a um privilégio que não mais se justifica, a Europa deveria indicar um não-europeu de uma das potências emergentes – como China, Índia ou Brasil – para munir o FMI da legitimidade de que ele necessita para enfrentar os complexos desafios financeiros da atualidade.
O governo brasileiro estaria certo, portanto, ao instar os líderes europeus a reconhecerem que os argumentos deles são falhos: o governo alemão, por exemplo, alega que o mundo precisa de um chefe no FMI “familiarizado” com “as particularidades da Europa, as questões monetárias, assim como as circunstâncias políticas daqui”. A chanceler alemã, Angela Merkel, acrescentou que “na situação atual, em que nos encontramos envolvidos em muitas discussões sobre o Euro, há boas razões para a Europa apresentar candidatos.” No entanto, durante a crise financeira latino-americana e asiática, os europeus não fizeram a menor questão de que o FMI tivesse como líder alguém de uma das regiões afetadas.
A intransigência da Europa não é, de forma alguma, uma novidade: no final do ano passado, líderes europeus resistiram longamente a uma redução de sua influência no FMI. Já passa da hora a oportunidade de um maior papel para China, Índia, África do Sul e Brasil nessa instituição. E a desproporcional voz da Europa no Conselho de Governadores – 33% dos votos contra apenas 20% da participação na produção econômica global – é difícil de se ignorar. No final das contas, a Europa concordou apenas com uma pequena redução de seu poder no FMI, provocando frustração entre as potências emergentes.
No entanto, o Brazil deve ter consciência do fato de que mais poder significa mais responsabilidade. Entregar o posto máximo do FMI a um representante das potências emergentes forçará potências em ascensão a desempenhar um papel construtivo nas instituições internacionais. Os líderes dessas novas potências não poderão mais culpar as “instituições imperialistas do mal”, como o ex-presidente Lula fazia freqüentemente. Os novatos no palco do poder chegaram, no passado, a esconder-se algumas vezes atrás do argumento de que não haviam sido autorizadas a exercer influência – um argumento que os permitia encobrir falta de vontade política ou coragem de encarar questões internacionais complicadas. Encarar com êxito esse desafio, no entanto, permitirá às potências emergentes reforçar a legitimidade das instituições internacionais e contribuir para a solução exitosa dos mais complexos desafios atuais – não contra as potências ocidentais estabelecidas, mas com elas.
Líderes mundiais precisam criar um processo de tomada de decisões transparente e meritocrático para eleger os melhores do mundo para os postos mais elevados do planeta, independentemente do passaporte que ele ou ela carregue. Desta vez, para sinalizar que a Europa honra suas promessas, um candidato não-europeu deveria ficar com o posto. O acordo de cavalheiros que deu à Europa o direito de indicar o chefe do FMI é o remanescente de uma velha era – e o governo brasileiro deveria instar os líderes europeus a conduzir o FMI ao século 21.
* Thorsten Benner é co-fundador e diretor associado do Instituto de Políticas Públicas Globais (GPPi) em Berlim. Oliver Stuenkel é professor de Relações Internacionais na Fundação Getulio Vargas em São Paulo.
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