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Os benefícios do grupo BRICS para o Brasil

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Essa semana, a Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, sediou a 6ª Cúpula do BRICS. Juntamente com a cúpula BRICS- América do Sul, para a qual o governo brasileiro convidou todos os chefes de Estado da América do Sul, será a mais significativa cúpula geopolítica do Brasil na história recente.

Desde a crise financeira de 2008, a ordem global está passando por uma fase complexa de adaptação para resolver a crescente tensão entre a multipolarização econômica e as instituições internacionais que ainda refletem uma ordem ocidentalmente centralizada, criada após a Segunda Guerra Mundial, quando a metade do PIB global era dos EUA.
Este processo é irreversível. Dadas as suas vastas populações, é apenas uma questão de tempo até que a China e a Índia recuperem seus status de centros da economia mundial, uma posição que haviam perdido temporariamente durante os últimos séculos.
Os dois principais protagonistas neste processo são os Estados Unidos, de um lado, e a China, de outro. São os policy makers em Washington, D.C. e Pequim que irão renegociar os termos e princípios subjacentes nos quais as instituições internacionais são construídas. A Índia pode, em algum momento, tornar-se um terceiro pilar nesta ordem emergente, mas dado os seus ainda graves desafios domésticos, demorará uma ou duas décadas até que ela possa alcançar o status global da China.

O Brasil encontra-se, em termos geográficos e geopolíticos, mais próximo dos Estados Unidos do que a China. Para muitos brasileiros, a ascensão da China ainda é algo abstrato, e o número de brasileiros estudando chinês é extremamente baixo. No Brasil, não há produção acadêmica sobre a China que seja internacionalmente reconhecida.
Não acontece da mesma maneira na Rússia e na Índia, onde ser vizinho da China tem consequências imediatas e visíveis. No entanto, a China já é o maior parceiro comercial do Brasil, e negociar a relação comercial entre os dois países é um dos principais desafios políticos do Brasil. Neste contexto, compreender a visão da China – como ela procura aplacar as preocupações sobre a sua ascensão, como ela pensa sobre o futuro de sua moeda nos assuntos globais e como ela imagina lidar com desafios como as mudanças climáticas e a segurança marítima no século XXI – é crucial para o Brasil para se adaptar com sucesso a estas novas realidades. Participar do banco de desenvolvimento do BRICS, a primeira manifestação institucional do grupo, permitirá que os economistas brasileiros trabalhem diretamente com especialistas chineses, adquirindo importante conhecimento das visões de Pequim sobre desenvolvimento. É também uma estratégia pragmática: se o Banco Mundial continuar a recusar-se a fornecer maiores direitos de voto às potências emergentes, o Brasil pode lentamente investir mais no Banco de Desenvolvimento do BRICS – ou se envolver em ambos.

São importantes os benefícios que o grupo BRICS gera para o Brasil. Além de aprender mais sobre a China, a cúpula dos BRICS-América do Sul é uma prova do poder convocatório e ambição de liderança regional do Brasil, um papel ao qual terá de se adaptar a longo prazo.

Além disso, ser um membro do BRICS não tem praticamente nenhum custo. A reação neutra do Brasil à crise da Crimeia não foi, como alguns analistas haviam sugerido, uma consequência de ser membro do grupo BRICS. Com relação à governança da Internet, a postura do Brasil diverge fortemente dos outros BRICS, mostrando que o Brasil não se sente obrigado a alinhar-se com posições chinesas ou russas, a menos que queira. Finalmente, a adesão do Brasil ao BRICS não afetará negativamente os laços de Brasília com os Estados Unidos ou qualquer outro ator internacional. Muito pelo contrário, os policy makers em Washington, D.C. levarão o Brasil mais a sério. Afinal, muitos nos Estados Unidos acreditam que Xi Jinping tenta transformar o BRICS em uma plataforma para avançar a agenda global da China.

Vários comentaristas acreditam ainda que a adesão do Brasil aos BRICS é um projeto antiamericanista inspirado por ideologias de esquerda. No entanto, isso seria uma má interpretação perigosa da ordem global e do lugar do Brasil na mesma. Os BRICS juntaram-se para criar algo novo sem o envolvimento dos EUA ou da Europa – mas isso não os torna anti-ocidentais por si só. Para o Brasil, a plataforma BRICS é uma maneira útil de facilitar a diversificação de suas parcerias e se adaptar a uma ordem global mais multipolar. O Brasil não precisa mais escolher entre estar próximo dos Estados Unidos ou do mundo em desenvolvimento – deve ter fortes laços tanto com potências estabelecidas quanto emergentes.

Portanto, reduzir o compromisso com o grupo BRICS (por exemplo, enviando apenas o vice-presidente para a cúpula do próximo ano na Rússia) ou deixar de ser um membro ativo no Banco de Desenvolvimento do BRICS iria prejudicar o interesse nacional do Brasil. Até o momento, ser um membro BRICS produziu apenas benefícios para o Brasil. Não há sinal de que isso mudará no futuro.

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Photo courtesy of MRE Brasil

SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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