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Seis anos depois de primeira cúpula, o grupo BRICS voltará à Rússia

2015

Quando a Rússia sediou a primeira cúpula dos líderes do grupo BRIC, em junho de 2009, com a participação do presidente brasileiro Lula, do presidente russo Medvedev, do primeiro-ministro indiano Manmohan Singh, e do presidente chinês Hu Jintao, o líder da Rússia saudou Yekatarinburg como “o epicentro da política mundial. “A necessidade de adequar a ordem global às grandes nações em desenvolvimento era “óbvia””, disse ele. Apenas um dia antes, a Rússia havia hospedado, na mesma cidade, a 9ª cúpula da Organização de Cooperação de Xangai (SCO), com muitos países observadores, incluindo uma breve visita de Mahmoud Ahmadinejad, que acabara de ser declarado vencedor de uma controversa eleição presidencial no Irã.

Os jornais ocidentais reagiram com uma mistura de descaso e rejeição. Como o The Economist escreveu na época:

Este quarteto díspar não conseguiu rivalizar com o G8 como fórum de discussão econômica. Em vez disso, o mais impressionante é que quatro países agrupados pelo economista-chefe do Goldman Sachs decidiram se encontrar de uma maneira tão visível.

Naquela época, mesmo observadores mais benignos dificilmente teriam previsto que o grupo dos BRICS (com S maiúsculo depois da integração da África do Sul) se transformaria na plataforma política mais proeminente fora do Ocidente. Desde 2009, nenhum líder perdeu uma cúpula. Além das reuniões anuais, mais de trinta reuniões relacionadas com o BRICS ocorrem por ano, em áreas tão diversas como a educação, finanças, saúde pública, agricultura e segurança nacional. Em 2014, o grupo criou o seu próprio banco de desenvolvimento e estabeleceu um acordo de reserva de contingência (CRA). O agrupamento alcançou visibilidade política sem precedentes, quando, em um comunicado conjunto, os representantes do BRICS rejeitaram os apelos para excluir a Rússia do G20, durante a Crise da Crimeia. Dessa maneira, dificultaram decisivamente as tentativas ocidentais de isolar a Rússia.

O crescimento econômico dos países do BRICS em 2015 será muito menor do que era em 2009. Os Estados Unidos já crescem mais rápido do que o Brasil, Rússia e África do Sul. Nesse sentido, visto de Brasília, Pretória e Moscou, o ambiente global oferece hoje menos oportunidades que há alguns anos atrás, quando os atores e instituições estabelecidas enfrentaram uma grave crise de legitimidade e quando potências emergentes salvaram a economia global de um colapso.

No entanto, seria errado prever que o grupo do BRICS deixará de existir. A reeleição de Dilma Rousseff no Brasil tem sido interpretada, na imprensa russa e indiana, como crucial na manutenção do processo de institucionalização do BRICS. Na verdade, não está claro até que ponto Aécio Neves, como presidente, teria continuado dando apoio a iniciativas como o Banco de Desenvolvimento do BRICS, visto por alguns como um rival para as instituições existentes. O princípio subjacente ainda se mantém: fazer parte do grupo BRICS gera benefícios tangíveis, embora praticamente não tenha custo.

No entanto, a 7ª Cúpula do BRICS (veja o site oficial da cúpula lançado recentemente) pode colocar essa lógica ao seu maior teste até então. Cada vez mais hostil em relação à ordem global vigente, a Rússia introduzirá uma série de medidas durante as discussões da cúpula que são susceptíveis de gerar fortes críticas no Ocidente, como argumentar que a União Internacional de Telecomunicações da ONU (ITU) deve substituir o governo dos Estados Unidos como controlador da ICANN (Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números), que gerencia a internet. Muitos criticos dizem que essa ideia permitirá regimes autoritários a desafiarem a liberdade na internet. Enquanto a China é favorável à proposta, o Brasil dificilmente a aceitará, considerando a sua liderança na questão durante o encontro NetMundial em 2014, em São Paulo.

Em várias outras áreas, a Rússia pode procurar politizar ainda mais a reunião do BRICS e usá-la como uma plataforma anti-ocidental, particularmente se as sanções atuais ainda estiverem em vigor no próximo ano. Essa estratégia gerará resistência entre os outros membros que não têm interesse em desnecessariamente antagonizar Washington. Os responsáveis da política externa brasileira terão o cuidado de não admitir que qualquer linguagem forte e excessiva seja redigida na declaração final da cúpula, o que poderia por em risco a principal meta de Brasília em 2015: reparar os laços com os Estados Unidos.

Mesmo sem impor suas ideias mais radicais sobre os outros países do BRICS, a cúpula será um sucesso para Vladimir Putin. Dentro de poucos dias, o presidente russo sediará não apenas os líderes do BRICS, mas também os chefes de Estado da Organização de Cooperação de Xangai (SCO), apenas um ano depois dos Jogos Olímpicos de Inverno. Isso mostra que a Rússia continuará a resistir com êxito as tentativas ocidentais para transformá-lo em um pária.

Durante a sétima cúpula, é provável que o BRICS anunciará algumas notícias sobre a criação do Banco de Desenvolvimento do BRICS, que está previsto para começar a operar em 2016. Infelizmente, é improvável que a Cúpula em Ufa se transforme em uma reunião rica em debates da sociedade civil, como aconteceu nas duas últimas cúpulas em Durban e Fortaleza, nas quais a sociedade civil organizou eventos vibrantes, muitas vezes com críticas a políticas adotadas por alguns membros do BRICS.

Contudo, participar do grupo do BRICS continua a ser um projeto altamente benéfico para o Brasil. Tanto que a presidente Dilma Rousseff, seu ministro das Relações Exteriores e vários ministros-chave do gabinete devem viajar para Ufa no próximo ano. Um canal direto e institucionalizado de comunicação com a China, bem como reuniões periódicas com líderes da Índia, da África do Sul e Rússia, são essenciais para o Brasil manter e fortalecer laços que permanecem surpreendentemente fracos.

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Photo credit: AFP PHOTO/Nelson Almeida – cartacapital

SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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