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Nelson Jobim: Missão impossível em Caracas?

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Dilma Rousseff indicou o ex-ministro Nelson Jobim para ser o observador do Brasil nas eleições parlamentares da Venezuela. O que esperar dele?

Conforme a Venezuela se aprofunda em uma mistura perigosa de instabilidade política, incerteza econômica e violência, a presidente Dilma Rousseff nomeou Nelson Jobim, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ex-ministro da Justiça e ex-ministro da Defesa, como enviado especial para a Venezuela para as eleições parlamentares do país em dezembro.

O histórico de Jobim é impressionante. Ao longo de sua carreira, ele se destacou por ser capaz de trabalhar de forma construtiva com todos os lados do espectro ideológico, sendo amigo de políticos de esquerda e direita que praticamente não dialogavam entre si. Como ministro da Defesa, Jobim foi essencial para consolidar o controle civil sobre os militares. Igualmente importante, ele avançou em várias iniciativas-chave que hoje representam a base da estratégia regional do Brasil como o Livro Branco da Defesa Nacional e o Conselho de Defesa Sul-americano da Unasul. Jobim desarmou com êxito algumas crises na região e emergiu como um importante interlocutor com os Estados Unidos em momentos de distanciamento diplomático.

Contudo, quando se trata de sua nova missão de garantir eleições livres e justas, as perspectivas são nada animadoras. Matias Spektor a chama de “missão impossível”, destacando que o Brasil há muito tempo perdeu a influência sobre o governo de Caracas ao não se pronunciar quando o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, passou a violar os direitos humanos e interferir nas fundações das instituições democráticas de seu país – redesenhando distritos eleitorais, demitindo juízes e aprisionando adversários políticos.

No auge dos confrontos violentos na Venezuela no ano passado, o Brasil deixou de ressaltar que tanto a oposição quanto o governo eram culpados. Em vez disso, o Brasil inicialmente co-emitiu três comunicados bastante brandos (por meio da Unasul, da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) e do Mercosul). O último foi particularmente controverso e interpretado como sendo permissivo com o governo Maduro, caracterizando manifestantes como forças anti-democráticas.

Em resposta, o então ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, defendeu a estratégia do Brasil, argumentando em entrevista à Folha de São Paulo que a declaração do Mercosul havia sido “mal interpretada”. No entanto, quando questionado pelo repórter se os líderes do Mercosul haviam tentado enviar uma mensagem ao presidente Maduro, Figueiredo respondeu que “Maduro não precisa de uma mensagem” – dificilmente um sinal de que o Brasil estava ansioso para se envolver na Venezuela.

Na verdade, o Brasil tem sido tão silencioso sobre a crise na Venezuela que alguns observadores acreditam que Maduro se safaria ao declarar um estado de emergência para adiar as eleições de dezembro. Afinal, mesmo com o sistema democrático em frangalhos na Venezuela, o Brasil ainda nem sequer emitiu um aviso de que uma maior deterioração poderia levar à suspensão da Venezuela tanto do Mercosul quanto da Unasul.

Tais argumentos são geralmente criticados pela esquerda brasileira, que olha para a situação na Venezuela através de uma lente ideológica, sem entender que Maduro perdeu, há tempos, apoio mesmo entre os líderes de esquerda na região. A oposição brasileira comete o mesmo erro, e não percebe que os oponentes de Maduro estão longe de ser ideais para restaurar a democracia genuína na Venezuela. Tais visões simplistas ignoram que hoje, a maior ameaça a Maduro não é a oposição, mas os líderes em seu próprio campo político, encabeçado por Diosdado Cabello.

A sociedade venezuelana está profundamente polarizada há anos, e o Brasil frequentemente tentou, com sucesso variável, evitar crises políticas no país vizinho. Depois de um fracassado golpe de Estado em abril de 2002 contra o então presidente Hugo Chávez, o Brasil buscou continuamente estabelecer um diálogo significativo entre governo e oposição. Artigos de jornais da época são notavelmente semelhantes àqueles publicados nos dias de hoje. Uma diferença interessante entre 2002 e hoje é que a Unasul substituiu a OEA como o quadro institucional das negociações, uma mudança que ainda não produziu resultados positivos.

Dada a desordem na qual a Venezuela se encontra, o que podemos esperar de Nelson Jobim? Seria certamente irrealista pedir ao enviado do Brasil que garanta sozinho eleições livres e justas na Venezuela. O país vai levar anos, quiçá décadas, para superar as divisões que se desenvolveram desde 2002.

Isso não muda o fato de que a crise política na Venezuela é um teste decisivo da capacidade do Brasil de defender os direitos humanos, a democracia e a estabilidade política na América do Sul. Jobim deve convencer os dois lados a estabelecer um diálogo real envolvendo compromissos sérios e mensuráveis que permitam uma disputa política honesta em dezembro. Uma primeira tarefa para Jobim será estabelecer um canal direto de comunicação com a oposição venezuelana, que considera hoje o Brasil como tímido, pró-Maduro, e sem imparcialidade para atuar como mediador e observador honesto. Isso implica sinalizar que, a não ser que os princípios básicos para eleições competitivas estejam em vigor, o Brasil está pronto para questionar abertamente legitimidade deles.

Como Rousseff está bem ciente, Jobim é famoso por não ter medo de se expressar abertamente em público, mesmo em assuntos que outros políticos preferem não comentar.

Os riscos da missão são consideráveis. Sem outros observadores oficiais no país em dezembro, o Brasil terá um papel decisivo na prestação de um selo internacional de aprovação – ou não – para os resultados das eleições em uma das sociedades mais polarizadas do mundo.

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SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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