http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2017/09/1921058-janela-de-oportunidade-se-fechou.shtml
Depois de numerosas tentativas frustradas ao longo dos últimos anos, fica evidente que governos da região não possuem a capacidade de ajudar a Venezuela a sair do fundo do poço. Há três razões pelas quais um esforço regional liderado pelo Brasil é implausível.
Primeiro, resta muito menos da democracia venezuelana hoje do que se via em 2003, quando o grupo “Amigos da Venezuela”, capitaneado pelo Brasil, foi crucial para restabelecer o diálogo entre o governo e a oposição.
Enquanto a distribuição de forças entre o governo de Hugo Chávez (1954-2013) e a oposição estava relativamente equilibrada à época, criando um incentivo para o diálogo, hoje o governo Maduro e as Forças Armadas concentram quase todo o poder.
Agora, a Venezuela é uma mistura de ditadura civil-militar e Estado falido, com vários oposicionistas presos ou exilados.
O que resta da oposição deixou de ter um papel relevante na política venezuelana. A maior ameaça a Maduro não vem da oposição, mas do próprio chavismo. Portanto, os incentivos para ele negociar uma saída são baixos.
Maduro sabe que, ao aceitar a promoção de eleições livres -condição inegociável para a oposição-, uma possível derrota nas urnas levaria a maior parte dos líderes políticos e militares do chavismo à prisão por envolvimento com tráfico de drogas, corrupção ou abusos de direitos humanos.
Em segundo lugar, o governo brasileiro está consumido por uma crise interna da qual dificilmente sairá antes das eleições em 2018, dificultando a articulação de uma estratégia regional.
Mesmo um governo brasileiro mais estável teria dificuldades de estabelecer um diálogo com o ator mais importante na Venezuela de hoje: as Forças Armadas, cuja aprovação é necessária para que Maduro tome qualquer decisão.
Sem uma diplomacia paralela sofisticada entre as Forças Armadas brasileiras e venezuelanas, não há como promover um diálogo real.
Por fim, qualquer tentativa de o Brasil liderar um esforço regional seria pouco viável pelo fato de nenhum dos quatro atores mais influentes na Venezuela hoje -Cuba, EUA, Rússia e China- integrar a América do Sul.
O ator mais poderoso na Venezuela é Pequim, que se tornou o maior investidor e credor do país. Com empréstimos de mais de US$ 65 bilhões a Caracas desde 2005, a China é um ator político que não se pode mais deixar fora da equação.
O segundo ator-chave é Washington, que continua comprando em torno de 700 mil barris de petróleo por dia. Contudo, em razão das sanções econômicas, o país vem perdendo espaço, e o governo venezuelano já articulou um plano B caso Donald Trump opte por um embargo econômico: compensar as perdas vendendo mais petróleo à China e à Índia.
O terceiro ator mais influente é a Rússia, cujos investimentos em blocos de petróleo salvaram a Venezuela do colapso no ano passado. Há sinais de que Moscou está disposta a investir alto para dar sobrevida ao regime de Maduro.
A parceria com Caracas é importante por várias razões. Entre 2012 e 2015, a Venezuela tornou-se o segundo maior comprador de armas russas. O regime também apoia os russos em fóruns multilaterais, quando Moscou continua sofrendo de isolamento.
Cuba, por fim, ainda presta ajuda incalculável no nível multilateral, evitando o isolamento diplomático e assessorando Maduro em questões internas.
Qualquer tentativa de melhorar a situação na Venezuela -seja pelo diálogo ou pressionando Caracas a aceitar ajuda humanitária- requer que China, EUA, Rússia e Cuba sentem à mesa. Na melhor das hipóteses, seremos coadjuvantes.
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OLIVER STUENKEL, 35, é professor de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo