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Mesmo fracassada, a escalada autoritária de Trump inspira populistas do mundo – e abala a tese do excepcionalismo americano de que não há golpe em inglês
OLIVER STUENKEL
07jan2021_15h06
Ao que tudo indica, a primeira tentativa de golpe de Estado da história dos Estados Unidos vai terminar em fracasso. Liderado por um presidente derrotado na reeleição, que tenta se manter ilegalmente no poder, o processo foi uma clássica tentativa de autogolpe que deixará feridas na política e na identidade do país. As imagens da invasão ao Capitólio com vidros quebrados, deputados sendo escoltados para locais secretos e seguranças sacando suas armas dentro do plenário da Câmara dos Deputados entrarão para a história como o momento de maior crise da democracia americana desde a Guerra Civil do século XIX.
Até agora, o Capitólio era considerado uma espécie de templo da democracia. Horas depois do ataque trumpista, enquanto discursava no processo de certificação da vitória de Biden e Harris, o senador democrata Cory Booker lembrou que, até hoje, o Congresso só havia sido invadido duas vezes, e em nenhuma delas os invasores empunhavam a bandeira dos Estados Unidos. A primeira ocorreu durante a chamada Guerra de 1812, entre Estados Unidos, Reino Unido e seus respectivos aliados, quando soldados britânicos ocuparam e destruíram o prédio na Batalha de Washington, em agosto de 1814. Na ocasião, os invasores bradavam a bandeira do ex-colonizador. Em 2021, os símbolos escolhidos foram bandeiras personalistas homenageando Trump, além da bandeira dos Estados Confederados, derrotados na Guerra Civil.
Tentativas de golpe ocorrem tão raramente na Inglaterra e nos Estados Unidos que sequer existe uma palavra em inglês para descrevê-las. Em francês, diz-se “coup d’État”. Em espanhol e em português, golpe de Estado. Em alemão, “Staatsstreich”. Os americanos pegam emprestado o termo francês. Nos últimos meses, a possibilidade de golpe foi aventada…