Dependência dos EUA sob Trump parece cada vez mais arriscada para governos em Berlim, Varsóvia, Seúl e Tóquio
A possibilidade de que ex-aliados dos Estados Unidos busquem um guarda-chuva nuclear próprio, diante da crescente imprevisibilidade de Washington sob a presidência de Donald Trump, deixou de ser tabu e passou a integrar o debate político em países como Alemanha, Polônia, França, Japão e Coreia do Sul. Pela primeira vez em décadas, governos historicamente protegidos pelo escudo nuclear dos EUA reavaliam se essa dependência ainda é uma estratégia segura.
Essas nações renunciaram ao desenvolvimento de armas nucleares em troca da proteção prometida por Washington, mas a credibilidade desse compromisso — base da dissuasão americana — nunca esteve tão abalada.
Na Alemanha, o debate sobre o papel do país em uma eventual dissuasão nuclear europeia ganhou força após a volta de Trump. O chanceler Friedrich Merz propôs que Berlim discuta com Londres e Paris um arranjo de compartilhamento nuclear europeu. Thorsten Benner, diretor do Global Public Policy Institute em Berlim, defende que a Alemanha invista em “latência nuclear”: desenvolver o conhecimento e a estrutura necessários para desenvolver armas rapidamente se for preciso, mas sem chegar na etapa de fato de produzí-las.
São recomendações que teriam sido impensáveis em um país que se sentia confortável por ter terceirizado sua segurança a seu maior aliado. Em vez de gastar bilhões em sua própria defesa, a Alemanha vivia em um “paraíso geopolítico” e podia se dar o luxo de negligenciar suas Forças Armadas, investindo pesadamente em áreas de amplo retorno social, como educação, pesquisa, saúde e infraestrutura.
Na Polônia, o debate avançou ainda mais rapidamente, com o premiê Donald Tusk cogitando firmar um acordo nuclear com a França ou buscar armas nucleares próprias.
Na Ásia, a Coreia do Sul discute abertamente a necessidade de manter uma postura de “latência nuclear” diante da ameaça da Coreia do Norte e da crescente aproximação entre Moscou e Pyongyang. Da mesma forma, figuras influentes em Tóquio discutem se o país deve garantir uma dissuasão autônoma, dado seu estoque de plutônio e capacidade industrial para montar um arsenal nuclear em poucos meses.
Esse movimento global de reavaliação da dependência nuclear dos EUA é alimentado por ações concretas do governo Trump: suspensão de armas para a Ucrânia, restrições a informações de inteligência e ameaça de cortar o acesso ucraniano ao sistema Starlink. Como resume Benner, “os europeus estão percebendo que, sobretudo em áreas militares sensíveis, precisarão ser autônomos”.
Até agora, nenhum dos países rompeu com o Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), que proíbe o desenvolvimento de armas atômicas por signatários não-nucleares. A maioria dos países europeus aposta em mais cooperação com França e Reino Unido, potências nucleares, como forma de compartilhar a responsabilidade…